São incontáveis as possibilidades e formas que temos de explorar as sensações do corpo através de diferentes práticas de movimento. Todas elas propõem, em maior ou menor grau, uma atenção cuidadosa àquilo que está acontecendo no corpo.
Eu imagino ser impossível jogar tênis sem estar atento ao posicionamento do corpo no espaço, sem ter consciência da sensação dos músculos, sem perceber a frequência da respiração. Mas para além das percepções físicas mais evidentes, existem caminhos de percepção mais sutis e refinadas, que exigem um pouco mais de atenção ao serem praticadas.
O movimento molda o cérebro
O movimento molda o cérebro e, se você reconhece isso, então pode reconhecer que levar a consciência a seus padrões de movimento pode alterar ou melhorar seus processos cognitivos e de percepção. E esse é um caminho que pode nos levar a transformações profundas em nossos padrões e nossa subjetividade.
Podemos pensar no par ceder/empurrar como padrões que estão presentes em diversas situações em nossa vida com implicações práticas (produção de movimento) e psíquicas (em nossa construção simbólica de si e do mundo).
Ceder é um convite à entrega, uma profunda conexão com a gravidade a partir do seu centro, ou seja, a partir da integridade da sua coluna. Quando você cede você entra em relação com a terra e isso traz enraizamento. A terra te recebe tanto quanto você recebe a terra, estabelece-se aí uma relação e entrega e suporte. Ceder não é colapsar, pois colapsar é perder seu centro e isso muda sua relação com a gravidade. O colapso é um estado passivo, no qual não há movimento possível a partir de si, ao passo que ceder é ativo e é uma preparação ao movimento a partir do empurrar.
Empurrar então torna-se um processo de diferenciação entre mim e o meu suporte (chão/terra). Diferenciar-se é assumir uma relação de complementaridade, ou seja, eu continuo em relação com a terra que me sustenta, mas entendo minha individuação pois estou conectado com meu centro. O oposto disso seria a rejeição, empurrar como um processo de rejeição cria oposição ou disputa.
O simples ato de caminhar pode te dar pistas sobre essas relações.
Você já se observou andando na rua? Se você tem uma rotina atarefada e um cronograma apertado, muito provavelmente você deve andar com pressa, sem perceber muito a sua coluna e menos ainda a forma como seus pés tocam o chão. No entanto, tente fazer esse experimento a próxima vez que for caminhar, seja na rua ou no ambiente que está mesmo:
CENTRAMENTO: Primeiro atente-se à sua coluna. Estabeleça-se no seu centro e perceba a respiração. Todo o movimento que irá se desdobrar, é um movimento de deslocamento da coluna no espaço, então permaneça com sua atenção à integridade da coluna. Mas lembre-se de não enrijecer o corpo, uma coluna íntegra se estabelece a partir do conforto.
CEDER: Ao caminhar, comece prestando atenção no ceder. Observe como seu pé entra em relação com o chão. Isso te enraíza e ajuda a te centrar. O ceder estabelece uma relação de entrega ativa sabendo que existe o suporte da terra. Você e a terra entram em uma relação de apoio mútuo e isso só pode existir quando há confiança na relação. Seus passos se tornam confiantes. Você está consciente do seu centro e do suporte que recebe.
EMPURRAR: Depois, você leva sua atenção para o empurrar, o momento em que você se projeta à frente e começa a retirar o pé no chão. Inicia-se a diferenciação. Diferenciar-se é assumir uma relação de complementaridade ao passo que rejeitar é uma oposição. Não nos opomos a terra, usamos a complementaridade necessária para caminhar. O pé sai de forma gentil do chão, preparando-se para voltar de forma também gentil, não agressiva. Seu passo assume a característica da leveza.
Notando sua coluna íntegra (estabelecendo-se em seu centro), buscando a entrega no ceder (adquirindo confiança) e percebendo a diferenciação no empurrar (assumindo a leveza) o seu caminhar torna-se uma experiência profunda de presença mudando completamente seu padrão corriqueiro pelo simples fato de estar praticando com atenção.
Lembre-se: esse é um caminho que pode nos levar a transformações profundas em nossos padrões e nossa subjetividade.
Muito Interessante estar atento a observação corporal. Essa consciência é muito importante para o autoconhecimento postural, para a concentração e o controle dos pensamentos alheios, entre outros benefícios. Muito obrigada!😀